sábado, 5 de março de 2011

Entrevista a revista Atrevidinha sobre adolescentes e seus conflitos: brigas, diferenças...

O texto abaixo foi publicado em fevereiro na revista Atrevidinha, revista da mesma editora da Atrevida e da Claudia, entre outras. O texto não será publicado aqui na íntegra por motivos de direitos autorais.

1) É realmente verdade que as meninas brigam mais do que os meninos?
Não é verdade. As brigas ocorrem tanto entre meninos, quanto entre elas. A diferença que existe é a maneira que brigam. Os meninos tendem a demonstrar mais a força física, tom de voz exaltado, palavrões durante um desentendimento para demonstrar sua superioridade e agredir o outro, enquanto as meninas fazem uso estrito da linguagem (crítica, fofoca, complôs, ofensas...) para ferir suas colegas. Portanto, as estratégias de brigas são diferentes, mas a quantidade de desentendimentos é parecida.
2) O que explicaria as diferenças que existem nos relacionamentos das meninas entre si e dos meninos e que transparecem particularmente no início da adolescência?
As meninas desenvolvem um vocabulário mais rico até mesmo porque aprendem em casa com as mães a detalhar os fatos que ocorrem no cotidiano. Em oposição, os meninos são educados pelos pais a serem mais objetivos e impositivos. Em outras palavras, os meninos desenvolvem menos repertório verbal e são mais diretos e em alguns casos mais ofensivos. Essas diferenças não acontecem apenas por aprendizagem familiar e social, todavia também a nível biológico (genética, hormônios...)...

3) Os meninos tendem a levar tudo na brincadeira, enquanto que para as meninas tudo é levado muito a sério? Há mais competitividade entre elas? E o que explicaria esse comportamento?
Na cultura masculina é muito comum o uso de ironias, chacotas, sarcasmos, brincadeiras... Inclusive se ele não tiver um pouco disso é excluído do grupo masculino. Um pai, em geral, é um modelo para seu filho, inclusive, no que diz respeito às brincadeiras. Além disso, ele pode ainda brincar frequentemente com seu filho reforçando sempre quando o filho faz um gracejo. Tudo isso forma um menino com este repertório específico. Na escola ele...
O outro ponto é que de fato as meninas são mais competitivas. No que diz respeito a natureza comportamental os biólogos e evolucionistas dizem que isso se deve a uma preparação para uma futura competição para um parceiro amoroso. Em outras palavras, elas aprendem a competir para selecionar os melhores parceiros. Já no nível da aprendizagem algumas regras inadequadas podem ser ensinadas em sua história de vida o que colabora...
É importante salientar que a competição é saudável, porque faz com que a menina melhore a si mesma para se destacar entre as outras. Já a rivalidade, quando surge, traz consigo o sofrimento, o ciúme, a inveja, a irritação, a diminuição da auto-estima...
4) Meninas, por outro lado, expressam mais suas insatisfações, chorando ou discutindo, enquanto os meninos se retraem, seguindo um padrão que vem da nossa cultura?
De fato, as meninas têm realmente uma propensão maior ao choro. Essas diferenças podem ser explicadas, em parte, pelos estereótipos. Espera-se de um homem que seja estóico, de modo a não demonstrar sinais de fraqueza. É a velha história: “Homem não chora.” Inclusive quando uma menina cai e chora muitos vão lá acudi-la, no entanto, quando um menino cai...
5) Quais as principais causas de conflitos entre as amigas, na fase da pré-adolescência? E como evitá-los?
Existem várias causas, e que estão relacionadas à imaturidade emocional, entre elas pode se destacar: ciúmes pelo fato de a amiga estar conversando ou se envolvendo com outras meninas; interesse afetivo pelo mesmo menino que a amiga; dificuldade em receber críticas; dificuldade em lidar com a outra menina que se destaca mais porque é mais bonita, mais inteligente, mais bem vestida, tem maior status perante o grupo ou autoridade...
6) Como saber respeitar o limite da outra e mostrar para a amiga onde é o seu limite, para que ela também respeite (o que também é uma maneira de evitar novas brigas)?
É sempre importante desenvolver uma linguagem para expressar os limites de cada um. Deixar claro aos outros quais são os seus limites. Um cachorro quando entra numa sala pela primeira vez, sem pestanejar ele urina para demarcar seu território, ou seja, estabelece um espaço para que outros cães não se aproximem. Nós humanos também...
7) Como a pré-adolescente que vai ler a matéria pode se preparar para lidar melhor com os conflitos, quando eles surgem na turma?
Primeiramente saber que conflito e relacionamento são inevitáveis. Ou seja, as pessoas têm histórias de vida distintas e por isso são diferentes e, portanto em algum momento da relação, as diferenças produzirão problemas, conflitos. Por isso é necessário ter consciência disso. Segundo, saber que a vida consiste de um acúmulo de aprendizagens e que muitas vezes estes conflitos serão fermentos para mudanças e crescimentos. Em outras palavras, não há como crescer sem dificuldades. Temos que aprender a gostar das surpresas e dos possíveis conflitos para crescer pessoalmente.

Um terceiro ponto é tentar, na medida do possível, usar a razão e não a emoção. Lembrando sempre que a emoção cega. Se estiver magoada...
8) Podemos mostrar às meninas um jeito diferente de resolver as divergências, através do diálogo e não da discussão, em que alguém pode sair ofendido? De que maneira isso pode ser feito?
Além do diálogo é necessário aprender a ceder. Saber que nem sempre consegue ser bem sucedido em tudo; ou que às vezes a outra pessoa não está preparada para ouvir determinados comentários; e nem sempre os outros existem para fazer o que queremos. Desenvolver tolerância à frustração é muito importante para viver relacionamentos duradouros e de qualidade. E ainda, não se magoar facilmente com o que as pessoas falam sobre a gente; Saber responder de forma assertiva, ou seja, dizendo o que pensa sem ofender os outros e tendo consciência dos direitos e deveres de cada um do relacionamento.

9) Até que ponto é natural as amigas brigarem? As brigas podem ter um lado positivo? Como aprender com as brigas?
Desentendimentos ocorrem constantemente nos relacionamentos. Um casal vai se desentender, assim como dois amigos. Quando você inicia um relacionamento é importante ter claro que as brigas e desencontros farão parte disso. Temos que aprender a gostar do dia e da noite. E termos claro que a vida é inconstante e às vezes até caótica. Há altos e baixos e temos que aprender a lidar com as situações desagradáveis.
Depois de uma briga tente se colocar no lugar da outra pessoa, lembre-se sempre dos limites das pessoas, observe também aquilo que você fez de errado com o outro. Aprenda a perdoar e peça desculpas nos momentos que perceber que pisou na bola. Lembrando sempre que somos humanos, falhos.

10) Se uma garota brigou com uma amiga e se arrependeu, como conversar com a outra para resolver o problema? E se ela não teve culpa, mesmo assim pode procurar a amiga?
Abrir um espaço de diálogo é sempre importante. Relacionamentos mais maduros e duradouros sempre têm espaço para dialogar. Quando não há diálogo abre espaço para ressentimentos e mágoas e isso distancia mais as pessoas.
Arrependimentos são muito comuns em brigas e está relacionado à responsabilidade. Quando percebemos que fomos responsáveis por algo de ruim tendemos a nos sentir culpado. É importante deixar claro que culpa está relacionada a quem fez um crime. Não temos que nos sentirmos culpados, mas sentirmos responsáveis e isso envolve corrigir o que foi feito. Por isso descreva o ocorrido e expresse o que você sentiu na situação e explique as razões de ter tomado aquela atitude. Ouça também o que a outra pessoa tem a dizer: seus sentimentos, opiniões e idéias. O desabafo de ambas pode colaborar muito com a reaproximação. Além disso, procure propor soluções ou regras para que isso não ocorra novamente.
Se não tiver culpa tente deixar o orgulho de lado pode ser que a amiga não está preparada para entender o que aconteceu. Lembre-se sempre que ceder de vez em quando faz parte de quem quer manter salvo a relação.

As imagens abaixo são da revista publicada.



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Reginaldo do Carmo Aguiar é psicólogo clínico comportamental, analista do comportamento e estudioso das Neurociências.

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