segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Sobre estabilidade

A Ilusão da estabilidade (dizem que é da Danuza Leão)

Segurança, garantia, estabilidade - quem não sonha com isso? No trabalho, no amor, em tudo na vida, é o que muita gente almeja, o bem supremo, os três primeiros passos para a felicidade. Passamos a vida sonhando com a casa própria, com a ilusão de que dela ninguém vai nos tirar, que haja o que houver lá estaremos, garantidos para sempre. Será? E quem não gostaria de um emprego público, daqueles em que, ao menor sinal de resfriado, se baixa ao leito sem remorso? Daqueles em que, depois de 15 dias de repouso, dá até para descolar um atestado médico para ficar no bem-bom por mais 40 dias? Tudo isso sem a menor culpa, sabendo que não faremos a menor falta à empresa (o país), que receberemos o salário no fim do mês e que, na volta, o patrão (o país) não vai fazer cara feia pela longa ausência. E a certeza, sobretudo a certeza de que demissão, nem pensar. A não ser que você esbofeteie seu chefe, não será nunca, jamais, mandada embora. E se acontecer, depois de um longo processo, com um amigo deputado tudo pode se arranjar. E a estabilidade suprema - o casamento. Tem que ser de papel passado, de preferência também no religioso. Que tranqüilidade saber que naquela folha de papel, assinada pelos dois, está a garantia de felicidade eterna, da fidelidade; a segurança de que o amor não vai acabar, de que ele vai voltar para casa todos os dias; e que, se passar a Ana Paula Arósio nua dizendo "vem cá, meu bem", ele não vai se sentir nem ao menos tentado. Ah,que maravilha é o casamento. Mas o de verdade, não o de juntar os trapinhos. Esse, baseado apenas em sentimentos, não quer dizer nada; só os outros são para valer. Um dia você consegue reunir essas três coisas tão fundamentais - a casa, o trabalho, o homem - e percebe que não é feliz. Coisa difícil a tal da felicidade. É conseguir as coisas? Não. É querer as coisas e tentar consegui-las? Talvez. Nessa longa procura passamos a vida toda, às vezes achando que encontramos, para logo ver que não era bem isso; quem sabe o caminho é outro, vamos tentar mais uma vez. Triste é um dia achar que não vale mais a pena, que já se sabe de tudo, que as histórias se repetem, que, no fundo, é tudo igual - até porque não é. Para que serve o amor, afinal? Para provar que não existe um dia igual a outro, um homem igual a outro, uma alegria igual a outra nem mesmo um sofrimento igual a outro. E é quando se descobre que não se sabe de nada que a vida fica maravilhosa. A certeza de que não existe certeza de nada. Saber que um curto circuito pode incendiar a casa que você nem acabou de pagar. Que o futuro presidente pode acabar com a estabilidade do seu emprego e você virar uma pessoa comum, correndo risco de ser demitida a qualquer momento. Que aquele homem pode sair para comprar cigarros e nunca mais voltar. Mas saber também que você pode sair para comprar um caderno e encontrar um homem que será seu grande amor, o maior de todos, pelo menos enquanto durar. A vida é mesmo muito boa.

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