terça-feira, 27 de novembro de 2012

Entrevista concedida ao portal IG sobre pessoas manipuladoras

Quem me entrevistou foi o repórter Ricardo Donisete, do portal iG de São Paulo. A pauta é sobre pessoas manipuladoras.
A entrevista editada foi publicada em dois sites:
a) Portal IG: http://delas.ig.com.br/comportamento/2012-11-30/como-identificar-um-manipulador.html
b) Globo.com: http://gazetaweb.globo.com/noticia.php?c=328725

Abaixo segue a entrevista na íntegra:
1) A manipulação é um comportamento de apenas parte da população ou nós todos somos manipuladores de alguma forma?
            De alguma forma todos somos manipuladores em maior ou menor grau e de formas diferentes.

2) A ideia da manipulação é quase sempre vista de forma negativa, como um comportamento de uma pessoa desonesta. Mas em algumas situações ser manipulador é necessário, como uma mãe que convence o filho a ir ao dentista?
A manipulação pode ser usada de forma benéfica para proteger a nossa autoestima. Principalmente em situações que se falarmos a verdade de nossos sentimentos ou segredos às pessoas inapropriadas, essas podem usar tais informações contra a gente, ao invés de nos apoiarmos.
Um certo nível de manipulação pode ser usado para o melhor convívio social porque não podemos ser totalmente honestos no convivo social, caso contrário podemos machucar os outros.
A mentira é uma forma de manipulação, muitas pesquisas revelam que as profissões que mais usam a conversa são as que mais mentem. Parece que o convívio com outras pessoas envolvem inevitavelmente certas formas de manipulação.
A manipulação benéfica pode ser usada para produzir alguns medos nos filhos como forma deles evitarem situações que possam ser prejudiciais a eles, como por exemplo, a dependência a cocaína ou nicotina. Em casos de tomar injeção os pais precisam sempre dizer aos filhos que não vai doer, mesmo sabendo que há o mínimo de dor durante o ato de aplicação da agulha, mas fazem essa manipulação porque querem o bem dos seus pupilos
Portanto, a manipulação faz parte dos relacionamentos e isso pode ser até saudável.

3) Quando a manipulação passa a ser nociva e negativa, acarretando problemas a terceiros e até a própria pessoa?
            Para avaliar sempre algo como problema é importante pensar nas seguintes variáveis: frequência, duração, intensidade e a intenção da manipulação. A manipulação passa a ser nociva quando acontece frequentemente, dura muito, é intensa e usada unicamente para ganho próprio. É o que acontece com pessoas de Personalidade Antissocial, Narcisista e Histriônica.
            É importante diferenciar a pessoa com perfil narcisista, aquela se comporta em alguns contextos valorizando-se em relação aos outros, da pessoa com Transtorno de Personalidade Narcisista, que se comporta na maioria dos contextos de forma narcisista e tem muita dificuldade de reconhecer sua personalidade e seus defeitos, o que não a faz mudar. Em outras palavras, a pessoa com perfil narcisista ou vaidosa tem um traço de caráter na composição de sua personalidade, já a pessoa com Transtorno de Personalidade Narcisista tem uma manifestação patológica.

4) É possível identificar uma pessoa manipuladora por meio de atitudes, gestos,  comportamentos e linguagem corporal? Quais são os principais? Você poderia dar algumas dicas de como identificar uma pessoa manipuladora?
            Eu poderia definir três grupos clássicos de pessoas manipuladoras:
            a) Pessoas narcisistas: Pessoas com sentimento de grandiosidade têm crenças de que são superiores a outras pessoas, de que têm direitos e privilégios especiais ou de que não estão sujeitas a regras de reciprocidade que guiam a interação social normal. Pessoas com esse perfil ou com o Transtorno de Personalidade Narcisista têm crenças, regras ou autorregras como: “Estou acima das regras ou tenho regras especiais”; “Mereço atenção e cuidado exclusivos”; “Sou o mais bonito(a) daqui”; “As coisas têm que ser do meu jeito porque sou o mais inteligente”. Nessas pessoas, o comportamento interpessoal mais frequente envolve atitude de grandiosidade; busca incessante por admiração e insensibilidade ao outro; transgressão de regras; autoengrandecimento, competitividade; uso dos outros para satisfação própria. Pessoas narcisistas acreditam que podem fazer tudo o que querem, independente da realidade, do que as outras pessoas consideram razoável ou do custo de seus atos para outras pessoas. Elas têm um foco exagerado na superioridade (estar entre os mais bem sucedidos, famosos, ricos...) para atingir poder ou controle. Às vezes, é possível observar competitividade excessiva ou dominação em relação aos outros: afirmar o próprio poder, forçar o próprio ponto de vista ou controlar o comportamento de outros segundo os próprios desejos, sem empatia ou preocupação com as necessidades ou desejos alheios.
            b) Pessoas antissociais: O termo antissocial aqui não quer dizer dificuldade social típico de pessoas tímidas, mas de antissocial por colocar o outro como objeto. A pessoa com esse perfil tem crenças, regras ou autorregras como: “Tenho minhas próprias regras: o negócio é levar vantagem em tudo”; “Os outros existem para serem usados”; “Tenho que acabar com o outro”; “Vale a pena ser sempre frio”. Desse modo, seu comportamento interpessoal mais frequente envolve desconsideração e violação dos direitos dos outros, como enganar (tapear ou trapacear), roubar e atacar, sem culpa ou remorso. Repertórios supervalorizados, relacionados a pessoas com o perfil de personalidade antissocial, podem ser típicos de ladrões, ditadores, violadores, assediadores escolares, sádicos, criminosos, psicopatas etc.
Pessoas com esse perfil se autovalorizam muito e têm uma forte propensão e habilidade para o engano, para a manipulação psicológica dos demais e para a racionalização de seus atos criminosos. Elas ignoram os direitos dos outros, não têm compaixão, não sentem culpa nem remorso. Para a maioria deles, forçar alguém a suportar a dor e a humilhação produz prazer e satisfação. Além disso, sempre veem a vítima como objeto e o domínio sobre ela produz a submissão e obediência. É muito comum, durante um relacionamento amoroso, esse indivíduo sentir ciúme, suspeitar de infidelidade e exigir o direito de ter a parceira ou parceiro como exclusivos. Não são poucos os casos em que a pessoa chega a matar seu parceiro amoroso e depois a si própria, devido a possíveis traições e o consequente orgulho ferido.
c) Pessoas histriônicas: A pessoa com esse perfil tem crenças, regras ou autorregras como: “Preciso impressionar”; “As pessoas devem me admirar”; “Ninguém tem o direito de negar-me satisfação”. Por isso, seu comportamento interpessoal mais frequente envolve emoções intensas e busca continuada de atenção e admiração, recorrendo à sedução, ao exibicionismo, a dramatizações, choros e gestos suicidas. Vale lembrar que há representantes do uso adequado dessa estratégia, como artistas, professores didáticos, políticos expressivos e palestrantes.
Em situações mais inadequadas, uma mulher com esse perfil, por exemplo, tende a se engajar na defesa de causas sociais para conseguir admiração, enquanto seus relacionamentos mais próximos fracassam. Apesar de essas pessoas terem uma autoconfiança no ato de seduzir, em geral, elas escondem pontos fracos, abismos de fragilidades e baixa autoestima. Um homem, por exemplo, pode falar que está muito doente para que as pessoas deem atenção a ele, mesmo não tendo problema algum de saúde.

5) Manipuladores costumam ser pessoas inteligentes? Eles usam argumentos que parecem lógicos para conseguir o que querem?
            Em geral pessoas antissociais e narcisistas tendem a fazer mais uso da razão para obterem o que querem. No caso de pessoas com transtorno de personalidade antissocial, os psicopatas, por exemplo, fazem mais uso de estratégias racionais para manipular os que o cercam. As pessoas manipuladas, em geral, demoram muito tempo para descobrir que foram enganadas por uma pessoa fria e inescrupulosa porque essa sempre passou a imagem de amorosa e íntegra. Pessoas narcisistas e antissociais estão próximas da gente e nem damos conta. Podem ser empresários, políticos, vendedores, namorados(as), qualquer um.

6) A culpa é uma das armas mais fortes das pessoas manipuladoras? Eles costumam se fazer de vítimas para as pessoas fazerem  o que eles querem?
            Uma pessoa manipuladora, em geral, usa diversas estratégias para ter o controle da situação. Até mesmo colocar-se como vítima para produzir o sentimento de culpa no outro. Não dá para dizer que é a arma mais forte, mas é muito usada.

7) Que atitudes podemos ter para barrar os manipuladores e não cair nas suas ‘armadilhas’? 
            Informação. Saber como eles funcionam, quais são as estratégias mais usadas para manipular. Isso facilita discriminar quem são e diminui a probabilidade de ser manipulado por eles.

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Reginaldo do Carmo Aguiar é psicólogo clínico comportamental, analista do comportamento e estudioso das Neurociências.

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