sábado, 30 de setembro de 2006

Sobre o cotidiano

Casas entre bananeiras

Mulheres entre laranjeiras

Pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.

Um cachorro vai devagar.

Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus. Drummond

Sobre felicidade

Da Felicidade

Quantas vezes a gente, em busca da ventura,

Procede tal e qual o avozinho infeliz

Em vão, por toda parte, os óculos procura,

Tendo-os na ponta do nariz!

(in Espelho Mágico, 1951) Mário Quintana

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Vinícius de Morais:

A felicidade é como a pluma

Que o vento vai levando pelo ar...

Voa tao leve, mas tem a vida breve.

Precisa que haja vento sem parar.(...)

A felicidade é como a gota de orvalho

Numa pétala de flor...

Brilha tranqüila,

Depois de leve oscila,

E cai como uma lágrima de amor.

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- Para Enfrentar a Infelicidade -

A mesma guarda cerceia a todos, quer os algemados, quer os que algemam.

Alguns dobram a cabeça sob a tirania alheia, enquanto outros sob a própria.

Alguns são retidos no mesmo lugar pelo exílio, outros pelo sacerdócio.

Enfim, a vida toda é servidão.

Com frequência uma área pequena, torna-se pela arte do arquiteto,

Apta para muitos usos e um recanto apertado se faz habitável.

Além do mais as nossas volúpias não devem ficar projetadas para espaço inacessível,

Permitamos, sim que despontem para nossa vizinhança,

Já que de modo pleno, não são elas passíveis de clausura.

Cuidemos de fazer o que esta a mão e corrobora nossas espectativas.

Saibamos que todas elas são transitórias, ainda que exteriorizando diversidades,

No íntimo, são mesmo voláteis.

Sêneca

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"A felicidade não depende do que nos falta, mas do bom uso que fazemos do que temos."

Thomas Handy

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"Em vão buscaremos ao longe a felicidade, se não a cultivarmos dentro de nós mesmos."

Rousseau

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Sobre saudade

"A saudade da amada criatura
É bem melhor do que a presença dela"

Mário Quintana



Na solidão na penumbra do amanhecer
Via você na noite, nas estrelas, nos planetas,
Nos mares, no brilho do sol e no anoitecer
Via você no ontem, no hoje, no amanhã...
Mas não via você no momentoQue saudade...

Mário Quintana




Saudades

Nas horas mortas da noite
Como é doce o meditar
Quando as estrelas cintilam
Nas ondas quietas do mar;
Quando a lua majestosa
Surgindo linda e formosa,
Como donzela vaidosa
Nas águas se vai mirar!
Nessas horas de silêncio
De tristezas e de amor,
Eu gosto de ouvir ao longe,
Cheio de mágoa e de dor,
O sino do campanário
Que fala tão solitário
Com esse som mortuário
Que nos enche de pavor.
Então - proscrito e sozinho -
Eu solto aos ecos da serra
Suspiros dessa saudade
Que no meu peito se encerra
Esses prantos de amargores
São prantos cheios de dores:
- Saudades - Dos meus amores- Saudades - Da minha terra!

(Casimiro de Abreu)





DA SAUDADE (Quintana)

A saudade que dói mais fundo
- e irremediávelmente -
É a saudade que temos de nós."




A Ave e o Poeta

A ave voa no tempo que passa,
Quebrou o ovo
Rompeu um mundo,
Ave de argamassa de esperança e fantasia,
Voa da janela no sorrir do dia,
Ave pássara que beija flor,
Tão bem te vi, alado cantor.
Onde te leva o vento, aos campos da alegria?
Mas ali não estou ave do meu amor,
Sou poeta sensorial, sem asas, sem casa, sem pátria, sem dor,
Meu coração é uma gaiola vazia que anseia uma paixão vadia,
Porém teu vôo é livre
Oh, pássara da liberdade,
Por que pousou nos meus olhos, se só te vejo pela saudade?

Sobre paixão e idealização

Amar

"Fechei os olhos para não te ver e a minha boca para não dizer...

E dos meus olhos fechados desceram lágrimas que não enxuguei,

E da minha boca fechada nasceram sussurros

E palavras mudas que te dediquei..."

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"Vinicios de Moraes"

De repente do riso fez-se o pranto

Silencioso e branco como a bruma

E das bocas unidas fez-se a espuma

E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento

Que dos olhos desfez a última chama

E da paixão fez-se o pressentimento

E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente

Fez-se de triste o que se fez amante

E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante

Fez-se da vida uma aventura errante

De repente, não mais que de repente

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Ai que distância

Meu ódio-amor

Que dores

Que cintilâncias

De pena.

Tão a meu lado

Te penso

No entanto

Tão afastado.

Como se a água ficasse

A um dedo de minha boca

E todo o deserto à volta

Me segurasse.

Tão triste e tão à vontade

Neste meu sol de martírios

Como se o corpo soubesse

Desses caminhos da sede

Porque nasceu conhecendo

Da paixão seu descaminho.

E brilhos no teu sadimo

E perdição na minha cara;

Que coloridos espinhos

Terás

Para tua dura saudade.

Que tempestades de sede

Nos areais da procura

Quando saíres à caça

De quem te amou.

De mim.

À caça do NUNCA MAIS.XLIII - Catares - Hilda Hilst (p. 78-79)

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Inconfesso Desejo (Carlos Drummond de Andrade)

Queria ter coragem

Para falar deste segredo

Queria poder declarar ao mundo

Este amor

Não me falta vontade

Não me falta desejo

Você é minha vontade

Meu maior desejo

Queria poder gritar

Esta loucura saudável

Que é estar em teus braços

Perdido pelos teus beijos

Sentindo-me louco de desejo

Queria recitar versos

Cantar aos quatros ventos

As palavras que brotam

Você é a inspiração

Minha motivação

Queria falar dos sonhos

Dizer os meus secretos desejos

Que é largar tudo

Para viver com você

Este inconfesso desejo

Que importa restarem cinzas se a chama foi bela e alta? (Quintana)

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" A paixão é a primeira a surgir e a primeira a desaparecer. A intimidade necessita de mais tempo para se desenvolver, e o compromisso, mais ainda".

Robert J. Sternberg (pesquisador de Psicologia Cognitiva)

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“As paixões são como ventanias que inflam as velas dos navios fazendo as navegar, outras vezes podem fazê-los naufragar, mas se não fossem elas, não haveria viagens, nem aventuras, nem novas descobertas.” – Voltaire

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Dois Olhos Negros (Lenine)

Queria ter coragem de saber,

O que me prende?

O que me paralisa?

Serão dois olhos negros como os teus,

Que me farão cruzar a divisa?

É como se eu fosse pro Vietnã,

Lutar por algo que não será meu.

A curiosidade de saber, quem é você?

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

Queria ter coragem de te falar,

Mas qual seria o idioma?

Congelado em meu próprio frio,

Um pobre coração em chamas.

É como se eu fosse um colegial,

Diante da equação, o quadro, o giz,

A curiosidade do aprendiz,

Diante de você...

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

O ocultismo, o vampirismo, o voodoo,

O ritual, a dança da chuva,

A ponta do alfinete, o corpo nu,

Os vários olhos da Medusa.

É como se estivéssemos ali,

Durante os séculos fazendo amor,

É como se a vida terminasse ali,

No fim do corredor...

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

Dois olhos negros...

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Samba em prelúdio (Baden Powell e Vinícius de Moraes)


Eu sem você não tenho porquê

Porque sem você não sei nem chorar

Sou chama sem luz, jardim sem luar

Luar sem amor, amor sem se dar

Em sem você sou só desamor

Um barco sem mar, um campo sem flor

Tristeza que vai, tristeza que vem

Sem você, meu amor, eu não sou ninguém

Ah, que saudade

Que vontade de ver renascer nossa vida

Volta, querida

Os meus braços precisam dos teus

Teus braços precisam dos meus

Estou tão sozinho

Tenho os olhos cansados de olhar para o além

Vem ver a vida

Sem você, meu amor, eu não sou ninguém

Sem você, meu amor, eu não sou ninguém

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Eu não existo sem você (Tom Jobim e Vinícius de Moraes)


Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim

Que nada nesse mundo levará você de mim

Eu sei e você sabe que a distância não existe

Que todo grande amor

Só é bem grande se for triste

Por isso, meu amor

Não tenha medo de sofrer

Que todos os caminhos

Me encaminham pra você

Assim como o oceano

Só é belo com luar

Assim como a canção

Só tem razão se se cantar

Assim como uma nuvem

Só acontece se chover

Assim como o poeta

Só é grande se sofrer

Assim como viver

Sem ter amor não é viver

Não há você sem mim

Eu não existo sem você

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Até Pensei (Chico Buarque)

Junto à minha rua havia um bosque

Que um muro alto proibia

Lá todo balão caía

Toda maçã nascia

E o dono do bosque nem via

Do lado de lá tanta aventura

E eu a espreitar na noite escura

A dedilhar essa modinha

A felicidade morava tão vizinha

Que, de tolo

Até pensei que fosse minha

Junto a mim morava a minha amada

Com olhos claros como o dia

Lá o meu olhar vivia

De sonho e fantasia

A dona dos olhos nem via

Do lado de lá tanta aventura

E eu a esperar pela ternura

Que enganar nunca me vinha

Eu andava pobre

Tão pobre de carinho

Que, de tolo

Até pensei que fosses minha

Toda a dor da vida

Me ensinou essa modinha

Que, de tolo

Até pensei que fosse minha

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CD: Circuladô 04:08

Lindeza (Caetano Veloso)

Coisa linda

É mais que uma idéia louca

Ver-te ao alcance da boca

Eu nem posso acreditar

Coisa linda

Minha humanidade cresce

Quando o mundo te oferece

E enfim te dás, tens lugar

Promessa de felicidade

Festa da vontade, nítido farol

Sinal novo sob o sol

Vida mais real

Coisa linda

Lua, lua, lua, lua

Sol, palavra, dança nua

Pluma, tela, pétala

Coisa linda

Desejar-te desde sempre

Ter-te agora e o dia é sempre

Uma alegria pra sempre

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AMBAR (Adriana Calcanhoto)

Tá tudo aceso em mim

Tá tudo assim tão claro

Tá tudo brilhando em mim

Tudo ligado

Como se eu fosse um morro iluminado

Por um âmbar elétrico

Que vazasse dos prédios

E banhasse a Lagoa até São Conrado

E ganhasse as Canoas

Aqui do outro lado

Tudo plugado

Tudo me ardendo

Tá tudo assim queimando em mim

Como salva de fogos

Desde que sim eu vim

Morar nos seus olhos

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Sobre conselhos

O mundo é um moinho... (Cartola)

Ainda é cedo amor

Mal começaste a conhecer a vida

Já anuncias a hora da partida

Sem saber mesmo o rumo que iras tomar...

Preste atenção querida

Embora eu saiba que estás resolvida

Em cada esquina cai um pouco tua vida

Em pouco tempo não serás mais o que és...

Ouça-me bem amor

Preste atenção o mundo é um moinho

Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos

Vai reduzir as ilusões à pó

Preste atenção querida

Em cada amor tu herdarás só o cinismo

Quando notares estás à beira do abismo

Abismo que cavastes,com teus pés...

"Cartola não existiu. Foi um sonho que a gente teve..."(Nelson Sargento)

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Quando não se tem firmes e calmos no horizonte da vida,

Como as linhas das montanhas e dos bosques,

A própria vontade íntima do homem vem a ser intranqüila,

Dispersa e sequiosa como a natureza do citadino:

Ele não tem felicidade nem dá felicidade.

Friedrich Nietzsche

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TEMPO PARA TUDO

Tudo neste mundo tem seu tempo;

Cada coisa tem sua ocasião.

Há um tempo de nascer e tempo de morrer;

Tempo de plantar e tempo de arrancar;

Tempo de matar e tempo de curar;

Tempo de derrubar e tempo de construir.

Há tempo de ficar triste e tempo de construir.

Há tempo de ficar triste e tempo de se alegrar;

Tempo de chorar e tempo de dançar;

Tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las;

Tempo de abraçar e tempo de afastar.

Há tempo de procurar e tempo de perder;

Tempo de economizar e tempo de desperdiçar;

Tempo de rasgar e tempo de remendar;

Tempo de ficar calado e tempo de falar.

Há tempo de amar e tempo de odiar;

Tempo de guerra e tempo de paz.

Eclesiastes 3,1-8

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Não desças os degraus do sonho

Para não despertar os monstros.

Não subas nos sótãos -

Onde os deuses, por trás das suas máscaras,

Ocultam o próprio enigma.

Não desças, não subas, fica.

O mistério está é na tua vida!

E é um sonho louco este nosso mundo...

Mário Quintana

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"O homem vive preocupado em viver muito e não em viver bem,

Quando na realidade não depende dele o viver muito, mas sim o viver bem".

"Se o que tens te parece insuficiente, então, mesmo que possuas o mundo, ainda assim se sentirás na miséria."

"Só uma coisa que sabemos: é que não sabemos nada."

"Você será avarento se conviver com homens mesquinhos e avarentos.

Será vaidoso se conviver com homens arrogantes.

Jamais se livrará da crueldade se compartilhar sua casa com um torturador.

Alimentará sua luxúria confraternizando-se com os adúlteros.

Se quer se livrar de seus vícios, mantenha-se afastado do exemplo dos viciados."

"Quanto maior é a prosperidade menos se deve confiar nela."

"O prêmio de uma boa ação é tê-la praticado."

"Nunca a fortuna põe um homem em tal altura que não precise de um amigo."

Seneca

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O rio – (Manuel Bandeira)

Ser como o rio que flui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas nos céus, refleti-las.
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranqüilas.

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Tese de um pensador russo chamado Guerdjef, que no início do século passado já falava em auto-conhecimento e na importância de se saber viver.Dizia ele: "Uma boa vida tem como base o sentido do que queremos para nós em cada momento e daquilo que, realmente vale como principal".

Assim sendo, ele traçou 20 regras de vida que foram colocadas em destaque no Instituto Francês de Ansiedade e Stress, em Paris.Dizem os "experts" em comportamento que, quem já consegue assimilar 10 delas, com certeza aprendeu a viver com qualidade interna. Ei-las:


1) Faça pausas de dez minutos a cada duas horas de trabalho, no máximo. Repita essas pausas na vida diária e pense em você, analisando suas atitudes.

2) Aprenda a dizer não sem se sentir culpado ou achar que magoou. Querer agradar a todos é um desgaste enorme.

3) Planeje seu dia, sim, mas deixe sempre um bom espaço para o improviso, consciente de que nem tudo depende de você.

4) Concentre-se em apenas uma tarefa de cada vez. Por mais ágeis que sejam os seus quadros mentais, você se exaure.

5) Esqueça, de uma vez por todas, que você é imprescindível. No trabalho, casa, no grupo habitual. Por mais que isso lhe desagrade, tudo anda sem a sua atuação, a não ser você mesmo.

6) Abra mão de ser o responsável pelo prazer de todos. Não é você a fonte dos desejos, o eterno mestre de cerimônias.

7) Peça ajuda sempre que necessário, tendo o bom senso de pedir às pessoas certas.


8) Diferencie problemas reais de problemas imaginários e elimine-os porque são pura perda de tempo e ocupam um espaço mental precioso para coisas mais importantes.

9) Tente descobrir o prazer de fatos cotidianos como dormir, comer e tomar banho, sem também achar que é o máximo a se conseguir na vida.

10) Evite se envolver na ansiedade e tensão alheias enquanto ansiedade e tensão. Espere um pouco e depois retome o diálogo, a ação.

11) Família não é você, está junto de você, compõe o seu mundo, mas não é a sua própria identidade.

12) Entenda que princípios e convicções fechadas podem ser um grande peso, a trave do movimento e da busca.

13) É preciso ter sempre alguém em que se possa confiar e falar abertamente ao menos num raio de cem quilômetros. Não adianta estar mais longe

14) Saiba a hora certa de sair de cena, de retirar-se do palco, de deixar a roda. Nunca perca o sentido da importância sutil de uma saída discreta.

15) Não queira saber se falaram mal de você e nem se atormente com esse lixo mental; escute o que falaram bem, com reserva analítica, sem qualquer convencimento.

16) Competir no lazer, no trabalho, na vida a dois, é ótimo ... para quem quer ficar esgotado e perder o melhor.

17) A rigidez é boa na pedra, não no homem. A ele cabe firmeza, o que é muito diferente.

18) Uma hora de intenso prazer substitui com folga 3 horas de sono perdido. O prazer recompõe mais que o sono. Logo, não perca uma oportunidade de divertir-se.

19) Não abandone suas 3 grandes e inabaláveis amigas: a intuição, a inocência e a fé!


20) E entenda de uma vez por todas, definitiva e conclusivamente: Você é o que se fizer ser!
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"Feliz aquele que pode conhecer as causas das coisas"

Virgílio

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“Quem serve a vários senhores, evita submeter-se a um tirano” – (desconhecido)

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“O que você faz em dez anos pode ser destruído em poucos segundos. A ansiedade põe tudo a se perder. È necessário calma e paciência para lidar com os desafios da vida. È preciso esperar o próprio tempo de cada coisa” – Reginaldo

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Aprendiz De Feiticeiro

Composição: ( Itamar Assumpção )

Aprendiz de feiticeiro

Aprendiz de feiticeiro

Aprendi quando criança que além de tudo balança

Esse nosso mundo cão

Aprendi que quem não dança, já dançou na sua infância

Senão rock foi baião

Aprendi da importância de não dar muita importância

Ficar com os meus pés no chão

Aprendi que viver cansa, mesmo vivendo na França

Mesmo indo de avião

Aprendi que a desavença, é por que sempre alguém pensa

Que ninguém mais tem razão

Aprendiz de feiticeiro

Aprendiz de feiticeiro

Aprendi que tudo passa,

tomando chá ou cachaça

Tomando champanhe ou não

Aprendi que a descrença, a desconfiança e a doença

São partes da maldição

Aprendi que a ignorância, a sordidez e a ganância

São lavas desse vulcão

Aprendi que essa fumaça a minha janela embaça

Por fora, por dentro, não

Aprendi tetra depressa que a taça do mundo é nossa

E que São Paulo é meu sertão

Aprendi que tudo passa, tomando chá ou cachaça

Tomando champanhe ou não

Aprendi que a descrença, a desconfiança e a doença

São partes da maldição

Aprendi que a ignorância, a sordidez e a ganância

São lavas desse vulcão

Aprendi que essa fumaça a minha janela embaça

Por fora, por dentro, nãoAprendi tetra depressa que a taça do mundo é nossa

E que São Paulo é meu sertão.

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“A sorte só contempla os espíritos preparados” Pasteur

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sexta-feira, 29 de setembro de 2006

Sobre mulheres

Poema número 1 (Pablo Neruda)


Corpo de mulher, brancas colinas, coxas brancas,

Te pareces ao mundo em tua atitude de entrega.

Meu corpo de camponês rude te escravizava

E fazia saltar o filho do fundo da terra.

Fui só como um túnel. De mim fugiam os pássaros

E em mim a noite entrava sua invasão poderosa.

Para sobreviver te forjei com uma arma,

Como uma flecha em meu arco, como uma pedra em minha funda.

Porém chega a hora da vingança, e te amo.

Corpo de pele, de musgo, de leite ávido e firme.

Ah! As taças do peito! Ah! Os olhos de ausência!

Ah! As rosas do púbis! Ah! Tua voz lenta e triste!

Corpo de mulher minha, persistirei em tua graça.

Minha sede, minha ânsia sem limite, meu caminho indeciso!

Obscuros leitos onde a sede eterna continua

E continua a fadiga e a dor infinita.





"Da Amizade entre as Mulheres
Dizem-se amigas... Beijam-se... Mas qual!
Haverá quem nisso creia?
Salvo se uma delas, por sinal
For muito velha ou muito feia..."

Mário Quintana







Receita de mulher (Vinícius de Moraes)

As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental.
É preciso que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
Qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize elegantemente em azul,
Como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível.
É preciso
Que tudo isso seja belo.
É preciso que súbito
Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche
No olhar dos homens.
É preciso, é absolutamente preciso
Que seja tudo belo e inesperado.
É preciso que umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como o âmbar de uma tarde.
Ah, deixai-me dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas.
Nádegas é importantíssimo.
Olhos, então nem se fala, que olhem com certa maldade inocente.
Uma boca fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras;
Que uns ossos despontem, sobretudo a rótula no cruzar as pernas,
E as pontas pélvicas no enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras:
Uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes.
Indispensável
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteia em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mais que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebal
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas bem haja um certo volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem
No entanto sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!)
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério.
Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos.
A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferiorA 37º centígrados,
Podendo eventualmente provocar queimaduras
Do primeiro grau.
Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
Que é preciso ultrapassar.
Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se se fechar os olhos
Ao abri-los ela não mais estará presente
Com seu sorriso e suas tramas.
Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida.
Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.

Sobre a lógica da vida

"Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás para frente. Nós deveriamos morrer primeiro, nos livrar logo disso. Daí viver num asilo, até ser chutado de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então trabalhar 40 anos até ficar jovem o bastante para poder aproveitar sua aponsetadoria. Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara para a faculdade. Você vai para o colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta ao útero da mãe, passa seus últimos 9 meses de vida flutuando... e termina tudo com um orgasmo! Não seria perfeito???"

Charles Chaplin
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“Feliz aquele que consegue conhecer as causas das coisas” – Virgílio
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Sobre o namoro

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namoro de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, de saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil. Mas, namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser parruda, decidida ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição. Quem não tem namorado, não é que não tem um amor: é quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes, mesmo assim pode não ter um namorado. Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho. Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa é quem ama sem alegria. Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugida ou impossível de durar. Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas: de carinho escondido na hora em que passa o filme: de flor catada no muro e entregue de repente, de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar, de gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário. Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer cesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d`agua, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos e musical da Metro. Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não chateia com o fato de o seu bem ser paquerado. Não tem namorado quem ama sem gostar; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada ou meio-dia de sol em plena praia cheia de rivais. Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele. Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo, e quem tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e de medo, ponha a saia mais leve, aquela de chita, e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras, e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada, e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo da janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteira: Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. Enlou-cresça.

Carlos Drummonde de Andrade

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A história de amor de Romeu e Julieta

Sabem porque Romeu e Julieta são ícones do amor? São falados e lembrados, atravessaram os séculosincólumes no tempo, seinstalando no mundo de hoje como casal modelo de amor eterno...Porque morreram e não tiveram tempo de passar pelas adversidades que os relacionamentos estão sujeitos pela vida afora. Senão provavelmente Romeu estaria hoje com a Manoela e Julieta com oRicardão. Romeu nunca traiu a Julieta numa balada com uma loira linda motivado pelo impulso do álcool. Julieta nunca ficou 5 h seguidas esperando Romeu...ligando incessantemente para o celular dele que estava desligado. Romeu não disse para Julieta que a amava, que ela era especial e depois sumiu por semanas. Julieta não teve a oportunidade de mostrar para ele o quanto ficava insuportável na TPM. Romeu não saia sexta-feira a noite para jogar futebol com os amigos e sóvoltava as 6 h da manhã bêbado. Julieta não teve filhos, engordou, ficou cheia deestrias e celulite e histérica com muita coisa para fazer. Romeu não disse para Julieta que precisava de um tempo, querendo naverdade curtir a vida e que ainda era muito novo parase envolver definitivamente com alguém. Julieta não tinha um ex-namorado em quem ela sempre pensava ficando porhoras distante, deixando Romeu com a pulga atrás daorelha. Romeu nunca deixou de mandar flores para Julieta no Dia dos Namorados alegando estar sem dinheiro. Julieta nunca tomou um porre fenomenal e num momento de descontrole bateu na cara do Romeu no meio de um bar lotado. Julieta nunca teve uma crise de ciúme achando que Romeu estava dando mole para uma amiga dela. Romeu não tinha uma ex-mulher que infernizava a vidada Julieta. Julieta nunca disse que estava com dor de cabeça e virou para o lado edormiu. Romeu nunca chegou para buscar a Julieta com uma camisa xadrez horrível...Por essas e por outras que eles morreram se amando...

Autoria de Luís Fernando Veríssimo

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Não vejo nada de romântico numa proposta de noivado. É certo que é romântico uma pessoa estar apaixonada. Mas numa proposta concreta não há romance nenhum; podemos até vir a ser aceites, e na grande maioria dos casos é isso que acontece, segundo creio, cessando nesse momento qualquer excitação. A própria essência do romance é a incerteza. Se algum dia me casar, farei tudo para me esquecer desse facto.

Oscar Wilde, in 'A Importância de se Chamar Ernesto'
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quinta-feira, 28 de setembro de 2006

Sobre o eu

Texto de Thiago Cunha (Thiago Cunha)

Especular sobre os devaneios das outras pessoas sempre vai te fazer pequeno. Pensar, simples e involuntariamente, já esmaga muito do que você acredita, criando outras certezas que serão esmagadas um pouco depois. É difícil acreditar em algo que exponha o que você realmente é. É difícil, impossível, ser uma coisa só. Talvez por isso algumas pessoas falem pouco, valorizando o poder do silêncio. Talvez por isso algumas pessoas falem e riam tanto, mostrando a coragem que querem mostrar que tem, de ser... seja lá o que for. Mentimos pra nós mesmos, muitas vezes, só para nos convencermos de que somos tal coisa, de que nunca mudamos ou de que agora somos totalmente diferentes. A verdade é que a nossa existência depende essencialmente da existência dos outros. Nós somos tudo o que vimos, tudo do que gostamos, tudo o que fizemos e que normalmente não faríamos. Nós somos aquele calafrio que se sente por alguém com quem você nunca conversou e que nem faz seu tipo, aquela alegria que vem sem explicação, durante o dia mais sem graça, o envolvimento com as personagens de um livro. Ser é como amar, como ter esperança, essas coisas que não dão pra tocar e das quais a gente vive apanhando.

Sobre o(a) autor(a):Estudante de Marketing de apenas 21 anos, Thiago já escreve seus textos com o propósito de lançar um livro, futuramente.
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"O que temos em comum é que sofremos da ilusão de que sabemos quem somos" Maria Lucia Romera (professora de Psicanálise da UFU)
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"Já trazes, ao nascer, tua filosofia.
As razões? essas vêm, posteriormente"

Mário Quintana
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“Julgar os outros é perigoso. Não tanto pelos erros que podemos cometer a respeito deles, mas pelo que podemos revelar a nosso respeito” – Voltaire
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“O ignorante não é aquele sem instrução, é aquele que não conhece a si próprio.”- Krishnamurti
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quarta-feira, 27 de setembro de 2006

Sobre o respeito ao outro

Frase de Voltaire:

"Eu não concordo com nenhuma palavra do que dizeis.
Mas eu defenderei até a morte o seu direito de dizê-las." ou “Posso não concordar com o que dizeis mas defenderei até a morte o direito de dizê-las” – Voltaire

Sobre o(a) autor(a): Voltaire(1694-1778) nasceu em Paris. Seu nome verdadeiro é François Marie Arouet. François revelou talento literário e sensibilidade poética na infância. Em 1717 é preso na Bastilha e adota o nome Voltaire. Autor de Micrômegas, Cândido, e outros romances.
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"Se em meio aos tortos por acaso andares
Fecha um olho"

Mário Quintana
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"Somos donos de nossos atos, mas não somos donos de nossos sentimentos.
Somos culpados pelo que fazemos, mas não somos culpados pelo que sentimos.
Podemos prometer atos, não podemos prometer sentimentos...Atos são pássaros engaiolados, sentimentos são pássaros em vôo"

(Mário Quintana)
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Sobre o locus de controle interno

É contra mim que luto (Miguel Torga)

É contra mim que luto.
Não tenho outro inimigo.
O que penso, o que sinto, o que digo, e o que faço, é que pede castigo e desespera a lança no meu braço.
Absurda aliança decriança e adulto, o que sou é um insulto ao que não sou;
E combato esse vulto que à traição me invadiu e me ocupou.
Infeliz com loucura e sem loucura, peço à vida outra vida, outra aventura, outro incerto destino. Não me dou por vencido, nem convencido. E agrido em mim o homem e o menino.

Sobre o(a) autor(a):Pseudônimo de Adolfo Correia da Rocha (1907-1995), português. Formado médico, este escritor passeou pela poesia, prosa, ficção, drama e fez um romance autobiográfico. Escritor independente, sem escola. Sobre o(a) autor(a):Pseudônimo de Adolfo Correia da Rocha (1907-1995), português.Formado médico, este escritor passeou pela poesia, prosa, ficção, drama e fez um romance autobiográfico.Escritor independente, sem escola.

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Palhaço (anônimo italiano)

Quando eu era jovem, eu pensava que com a arte seria possível mudar o mundo. Eu buscava constantemente um espetáculo que pudesse despertar no coração do público uma esperança. Eu queria mostrar uma maneira diferente de viver, com mais amizade, criatividade, sem a obrigação de perseguir o dinheiro e o poder. Ilusão fútil que eu nunca consegui alcançar. Não só a revolução não chegou, como as pessoas se tornaram cada vez mais loucas e materialistas. Quando eu me dei conta disto eu vivi momentos difíceis pensando, pensando inclusive que minha vida era um fracasso e que todo esforço era inútil. Mas um dia eu tive uma revelação: se não se pode mudar o mundo, pelo menos é possível mudar a si mesmo, encontrar algo em seu coração, um desejo, uma necessidade e entregar-se totalmente a ele, sem olhar para trás. Isso não é para a sociedade ou para os outros, não, é para você mesmo. E eu fazendo esse palhaço que eu sou, eu encontrei essa coisa. Provocar, burlar e fazer o público rir. Isso era tudo o que eu buscava em minha vida. Por certo eu não mudava o mundo, mas os palhaços nunca mudaram o mundo, passam o tempo tentando sem nunca conseguir, por isso são palhaços. Os palhaços gostam do fracasso e das ações ineficazes, são perdedores alegres e isto é a verdadeira força que têm, nunca se cansam de perder. Desfrutam de cada fracasso e voltam em seguida a fracassar de novo, diluindo assim as certezas das pessoas sérias e que nunca duvidam. Então, esse sangue que pareço ter na minha cabeça, esse sangue que tenho sobre a minha camisa, esse sangue que tenho no meu coração, esse sangue que está todo em mim é tão patético e inútil em seu simbolismo porque é sangue de um palhaço. Um sangue que não vem de uma grande luta ou em nome de uma causa heróica. É sangue de brincadeira, ao mesmo tempo verdadeiro e pouco importante.

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NÃO DISCUTO

"não discuto com o destino o que pintar eu assino"

Paulo Leminski

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" Eis a sublime estupidez do mundo: quando nossa fortuna está abalada - muitas vezes pelos excessos de nossos próprios atos - culpamos o sol, a lua e as estrelas pelos nossos desastres; como se fôssemos canalhas por desígnios lunares, idiotas por influência celeste; escroques, ladrões e traidores por comando zodíaco. (...) É a admirável desculpa do homem devasso - responsabilizar uma estrela por sua devassidão!".

Rei Lear, ato I, cena II - W. Shakespeare

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Confissão

Que esta minha paz e este meu amado silêncio
Não iludam a ninguém
Não é a paz de uma cidade bombardeada e deserta
Nem tampouco a paz compulsória dos cemitérios
Acho-me relativamente feliz
Porque nada de exterior me acontece...
Mas,
Em mim, na minha alma,
Pressinto que vou ter um terremoto!

Mário Quintana
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Sobre a esperança

Carl Sandburg

Agora que a mansão está concluída, os trabalhadores começam a grade.
São barras de ferro com pontas de açocapazes de tirar a vida a quem se arrisque sobre elas. Uma obra prima que impedirá a entrada de famintos, crianças de rua e vagabundos.
Vagabundos de toda espécie.
Entre as barras e sobre as pontas de aço nada passará excetoa chuva, a morte e o dia de amanhã.

Sobre o(a) autor(a): Carl Sandburg nasceu pobre, em Gallesburg, Illinois, no ano de 1878, e fez-se poeta famoso, folclorista e historiador respeitado, dentre outras inúmeras profissões exercidas durante sua rica e prolífica vida.
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Mil lágrimas
Itamar Assumpção
Composição: Itamar Assumpção E Alice Ruiz

Milágrimas(Alice Ruiz e Itamar Assumpção)

Em caso de dor ponha gelo
Mude o corte de cabelo
Mude como modelo vá ao cinema dê um sorriso ainda que amarelo,
Esqueça seu cotovelo se amargo foi já ter sido
Troque já esse vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério
Deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada mil lágrimas sai um milagre
Caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa
Coma somente a cereja
Jogue para cima
Faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra penas viva apenas
Sendo só fissura ou loucura quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena
Reze um terço
Caia fora do contexto
Invente seu endereço
A cada mil lágrimas sai um milagre
Mas se apesar de banal chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal do sal do sal
Sinta o gosto do sal gota a gota,
Uma a uma duas três dez cem mil lágrimas
Sinta o milagre
A cada mil lágrimas sai um milagre
Cante as rimas de um poema
Sofra penas
Viva apenas
Sendo só fissura ou loucura quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena
Reze um terço
Caia fora do contexto
Invente seu endereço a cada mil lágrimas sai um milagre

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Overmundo (de Murilo Mendes)

Os pinheiros assobiam, a tempestade chega:
Os cavalos bebem na mão da tempestade.
Amarro o navio no canto do jardim
E bato à porta do castelo na Espanha.
Soam os tambores do vento.

"Overmundo, Overmundo, que é dos teus oráculos,
Do aparelho de precisão para medir os sonhos,
E da rosa que pega fogo no inimigo?
"Ninguém ampara o cavaleiro do mundo delirante,
Que anda, voa, está em toda a parte
E não consegue pousar em ponto algum.
Observai sua armadura de penas
E ouvi seu grito eletrônico.

"Overmundo expirou ao descobrir quem era",
Anunciam de dentro do castelo na Espanha.
"O tempo é o mesmo desde o princípio da criação",
Respondem os homens futuros pela minha voz.

Fonte: Poesia Liberdade (1947)


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Vinicius de Moraes

Pra que chorar
Se o sol já vai raiar,
Se o dia vai amanhecer.
Pra que sofrer
Se a lua vai nascer,
É só o sol se pôr.
Pra que chorar se existe amor,
A questão é só de dar,
A questão é só de dor.
Quem não chorou,
Quem não se lastimou,
Não pode nunca mais dizer
Pra que chorar,
Pra que sofrer,
Se há sempre um novo amor
Em cada novo amanhecer

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A estrela – (Manuel Bandeira)

Vi uma estrela tão alta,
Vi uma estrela tão fria!
Vi uma estrela luzindo
Na minha vida vazia.

Era uma estrelas tão alta!
Era uma estrela tão fria!
Era uma estrela sozinha
Luzindo no fim do dia.

Por que da sua distância
Para a minha companhia
Não baixava aquela estrela?
Por que tão alta luzia?

E ouvi-a na sombra funda
Responder que assim fazia
Para dar uma esperança
Mais tarde ao fim do meu dia.
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"Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a primavera inteira!"

Che Guevara
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Primeira Infância

Era rosa, era malva, era leite,
As amigas de minha mãe vaticinando:
Vai ser muito feliz, vai ser muito famosa
Eram rendas, pano branco, estrela dalva,
Benza-te a cruz, no ouvido, na testa.
Sobre tua boca e teus olhos
O nome da trindade te proteja.
Em ponto de marca no vestidinho: navios.
Todos à vela.
A viagem que eu faria em roda de mim.

Adélia Prado, p.l48
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Sobre o Amor próprio

Ninguém Sabe (Renata Pallottini)

Ninguém sabe mas você foi o escolhido. O seu amor é único, o seu amor é um homem sentado pensando em seu cachorro morto. O seu amor é a última orquídea do inverno é pássaro pedindo água pupila adormecida. E você nem se importa pelo fato de ser melhor. O seu nariz é grego, você é tão bonito e nem liga. É verdade que você tem sofrido muito mas isso faz parte. Quando você anda na rua as árvores florescem. Você é meu amigo. Você é eu.

Sobre o(a) autor(a):Paulista - 1931. Cursou Direito, Filosofia e Dramaturgia.Roteirista do programa infantil Vila Sésamo e da série Malu Mulher, entre inúmeros outros. Alguns de seus livros: Acalanto, A Casa, Coração Americano, Noite Afora e Chão de Palavras.

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As Borboletas

Com o tempo, você vai percebendo que, para ser feliz com uma outra pessoa você precisa, em primeiro lugar, não precisar dela. Percebe, também, que aquela pessoa que você ama (ou acha que ama) e que nao quer nada com você, definitivamente, não é o homem (ou mulher) da sua vida. Você aprende a gostar de você, a cuidar de você, principalmente, a gostar de quem também gosta de você. O segredo não é correr atrás das borboletas... E cuidar do jardim para que elas venham até você. No final das contas, você vai achar não quem você estava procurando... Mas quem estava procurando você.

(Mario Quintana)
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Liliana Barabino

"Mesmo antes de nascer, já tinha alguém torcendo por você. "Tinha gente que torcia para você ser menino.Outros torciam para você ser menina. Torciam para você puxar a beleza da mãe, o bom humor dopai. Estavam torcendo para você nascer perfeito. Daí continuaram torcendo. Torceram pelo seu primeiro sorriso, pela primeira palavra, pelo primeiro passo. O seu primeiro dia de escola foi a maior torcida. E o primeiro gol, então? E de tanto torcerem por você, você aprendeu a torcer. Começou a torcer para ganhar muitos presentes e flagrar Papai Noel. Torcia o nariz para o quiabo e a escarola. Mas torcia por hambúrguer e refrigerante. Começou a torcer até para um time. Provavelmente, nesse dia, você descobriu que tem gente que torce diferente de você. Seus pais torciam para você comer de boca fechada, tomar banho, escovar os dentes, estudar inglês e piano. Eles só estavam torcendo para você ser uma pessoa bacana. Seus amigos torciam para você usar brinco, cabular aula, falar palavrão. Eles também estavam torcendo para você ser bacana. Nessas horas, você só torcia para não ter nascido. E por não saber pelo que você torcia, torcia torcido. Torceu para seus irmãos se ferrarem, torceu para o mundo explodir. E quando os hormônios começaram a torcer, torceu pelo primeiro beijo, pelo primeiro amasso. Depois começou a torcer pela sua liberdade. Torcia para viajar com a turma, ficar até tarde na rua. Sua mãe só torcia para você chegar vivo em casa. Passou a torcer o nariz para as roupas da sua irmã, para as idéias dos professores e para qualquer opinião dos seus pais. Todo mundo queria era torcer o seu pescoço. Foi quando até você começou a torcer pelo seu futuro. Torceu para ser médico, músico, advogado. Na dúvida, torceu para ser físico nuclear ou jogador de futebol. Seus pais torciam para passar logo essa fase. No dia do vestibular, uma grande torcida se formou. Pais, avós, vizinhos, namoradas e todos os santos torceram por você. Na faculdade, então, era torcida pra todo lado. Para a direita, esquerda, contra a corrupção, a fome na Albânia e o preço da coxinha na cantina. E, de torcida em torcida, um dia teve um torcicolo de tanto olhar para ela. Primeiro, torceu para ela não ter outro. Torceu para ela não te achar muito baixo, muito alto, muito gordo, muito magro. Descobriu que ela torcia igual a você. E de repente vocês estavam torcendo para não acordar desse sonho. Torceram para ganhar a geladeira, o microondas e a grana para a viagem de lua-de-mel. E daí pra frente você entendeu que a vida é uma grande torcida. Porque, mesmo antes do seu filho nascer, já tinha muita gente torcendo por ele. Mesmo com toda essa torcida, pode ser que você ainda não tenha conquistado algumas coisas. Mas muita gente ainda torce por você!"

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"Se até o alfaiate gaba o seu corte ao freguês,
Porque motivo só não pode o poeta elogiar o que fez?"

Mário Quintana

Sobre os que são da esquerda

Hino dos Comedidos (Lupe Cotrin)

Não me agradam esses homens bem fracionados no tempo, cedendo-se amavelmente em todas as ocasiões. E mais também não me agradam os partidários tão vários de toda a moderação. Passo distante dessa gente comedida e moderada, que guarda o vinho 20 anos para bebê-lo mais velho, homens de ferro que só sabem anunciar a mensagem da espera, que aguardam o momento oportuno, que, sempre expelindo relógios, resistem à melhor viagem, que desconhecem as emoções, que sabem apenas sofrer sincronizados as tristezas publicadas nos jornais. Adeus, moderados. Adeus, que sou diferente: compreendo a mulher que rasga as vestes e sinto imensa ternura pelo homem desesperado.

Sobre o(a) autor(a):Lupe Cotrin foi professora na USP/ECA na década de 60/70.


"Eu vim" (Murilo Mendes)

Eu não nasci no começo desse século. Eu nasci no plano do eterno. Eu nasci de mil vidas superpostas. Nasci de mil ternuras desdobradas. Eu vim para conhecer o mal e o bem. E para separar o mal e o bem. Eu vim para amar e ser desamado. Eu vim para ignorar os grandes e consolidar os pequenos. Eu não vim construir a minha riqueza. Não vim construir a minha própria riqueza. Mas não vim para destruir a riqueza dos outros. Eu vim para reprimir o choro formidável. Esse choro formidável que as gerações anteriores me transmitiram. Eu vim para experimentar a dúvida e a contradição. E aprendi que é preciso idolatrar a dúvida.

Sobre o(a) autor(a):Um dos maiores poetas brasileiros, Murilo Mendes, nasceu em Juiz de Fora - MG em 1901.Foi professor de cultura brasileira na Universidade de Roma.Faleceu em 1975 em Lisboa.

Sobre nostalgia

Fragmentos (Raimundo Gadelha)

As nossas casas deveriam ter infância. Não a insignificância de um rótulo (néo-coloniais, barrocas, modernas, prontas para morar) ou coisa parecida. O ideal seria que tivessem fases vivas, em que pudessem modificar sua forma e crescer com a gente.Hoje, o desconhecido se agiganta diante de mim. O elevador panorâmico eleva e esparrama o que me deprime. Do alto, tento localizar meu antigo endereço. Mas tudo se perde entre prédios, carros e multidões. Minha identidade não mora mais aqui.

Sobre o(a) autor(a):Nascido na Paraíba, estudou em Nova York e se especializou em Tóquio.Poeta, publicitário, jornalista e fotógrafo, é editor responsável e autor da Escrituras Editora.

Outros

Espetáculo (Álvaro Alves de Faria)

O salto mortal é meu número especial nesta tarde de domingo.
Não tentarei o trapézio, por não saber voar sobre as cabeças que torcem para a corda arrebentar.
Pensando bem, abrirei a tarde falando ao respeitável público que farei a mágica final: desaparecer sem nunca ter sido visto por ninguém.

Sobre o(a) autor(a):Paulistano, jornalista, poeta e escritor. Ganhou inúmeros prêmios, entre eles o Prêmio Jabuti.Foi preso cinco vezes e levado ao Dops (década de 1960), acusado de subversivo, por seus recitais públicos de poesia em São Paulo.

Frases de Novalis

Novalis
"O curioso é que nós estamos mais ligados ao invisível do que ao visível".
"Todo corpo aspira a independência".
"As revelações não se deixam conquistar pela força".
"O homem não é o único a falar, o universo fala, tudo fala, linguagens infinitas".


Sobre o(a) autor(a):Novalis, nome literário de Georg Friedrich Philipp von Hardenherg (1772 - 1801). Poeta excepcional, um dos maiores escritores alemães. "Hino para a noite" reune seis poemas de sua autoria que marcaram a fundação do Romantismo.Sobre o(a) autor(a):Nome literário de Georg Friedrich Philipp von Hardenherg (1772 - 1801). Poeta excepcional, um dos maiores escritores alemães. "Hino para a noite" reune seis poemas de sua autoria que marcaram a fundação do Romantismo.

Frustrações, decepções e euforias (Samuel Rawet)

Tenho grandes frustrações e decepções. Tenho grandes euforias. Amo e odeio apaixonadamente. Uma vida intensa, difícil, saborosa! Acho a vida uma grande aventura. Espero que os idiotas me compreendam. Sobre o(a) autor(a): Nascido na Polônia, veio para o Brasil com sete anos. Samuel Rawet (1929 - 1984) era muito introvertido e até esquisito. Andava pelas ruas de Brasília de shorts, chinelo e uma gaiola nas maõs: "para pegar rato judeu". Samuel era judeu.




"No mistério do sem-fim
Equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim, e, no jardim, um canteiro;
No canteiro uma violeta, e, sobre ela, o dia inteiro,
Entre o planeta e o sem-fim, a asa de uma borboleta"

[Cecília Meireles]


Canção do vento e da minha vida


O vento varria as folhas,
O vento varria os frutos,
O vento varria as flores...
E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De frutos, de flores, de folhas.
O vento varria as luzes
O vento varria as musicas,
O vento varria os aromas...
E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De aromas, de estrelas, de cânticos.
O vento varria os sonhos
E varria as amizades...
O vento varria as mulheres...
E a minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De afetos e de mulheres.
O vento varria os meses
E varria os teus sorrisos
O vento varria tudo!
E minha vida ficava
Cada vez mais cheia
De tudo!



Bandeira




"Os grilos abrem trinchas no silêncio"
"A maior do vento é não ser colorido" Quintana

Sobre os óculos que usamos ou o que ficamos sob controle

Beco (Manuel Bandeira)

Que importa a paisagem, a glória, a baía, a linha do horizonte ?
- O que eu vejo é o beco!

Sobre o(a) autor(a): 1886 - 1968. Manuel Bandeira nasceu em Recife e morou no Rio de Janeiro e São Paulo. Iniciou o curso de Arquitetura e o abandonou por causa da tuberculose. Não chegou a participar da Semana de 22. Entrou para Academia Brasileira de Letras em 1940.
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Cego (Silas Corrêa Leite)

Cego de nascença, aprendeu a ler no escuro. Desde pequeno, os livros lhe eram abertos, os toques lhe fundavam janelas, os sons lhe eram caminhos de pedra.Um dia, achou um doador de córnea e pensou que os recursos adquiridos poderiam lhe render a visão total.Não aceitou ser operado por conta do governo, nem enxergar no claro. Ficou com medo de se olhar no espelho das pessoas e ter medo da escuridão que havia nelas.

Sobre o(a) autor(a):Site pessoal de Silas Corrêa Leite: www.itarare.com.br/silas.htm
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EXAME DE CONSCIÊNCIA

Se eu amo o meu semelhante? Sim.
Mas onde encontrar o meu semelhante?

Mario Quintana - Caderno H
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Alberto Caeiro

Ontem o pregador de verdades dele
Falou outra vez comigo.
Falou do sofrimento das classes que trabalham
(Não do das pessoas que sofrem, que é afinal quem sofre).
Falou da injustiça de uns terem dinheiro,
E de outros terem fome, que não sei se é fome de comer.
Ou se é só fome da sobremesa alheia.
Falou de tudo quanto pudesse faze-lo zangar-se.
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A Coisa

A gente pensa uma coisa, acaba escrevendo outra e o leitor entende uma terceira coisa... e, enquanto se passa tudo isso, a coisa propriamente dita começa a desconfiar que não foi propriamente dita.

Mário Quintana
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A ESPERTEZA DO MUNDO

Não fiques em terreno chão !
Não subas alto demais !
De meia altura é que o mundo
Se apresenta mais bonito.

Friedrich Nietzsche
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"Mera ilusão auditiva graças a qual a gente ouve sempre 'tic-tac' e nunca 'tac-tic'; depois disso, como acreditar nos relógios? Ou na gente?"

Quintana
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"Eu quero ser sempre aquilo com quem eu simpatizo,
E eu torno-me sempre, mais cedo ou mais tarde
Aquilo com quem eu simpatizo.
E eu simpatizo com tudo.
São-me simpáticos os homens superiores
Porque são superiores,
E são-me simpáticos os homens inferiores
Porque são superiores tanto,
Porque ser inferior é diferente de ser superior,
E isso é uma superioridade a certos momentos de visão.
Eu simpatizo com alguns homens
Pelas suas qualidades de caráter
Com outros eu simpatizo pela falta dessas mesmas qualidades
E com outros ainda eu simpatizo por simpatizar com eles
Porque eu sou rei, absoluto na minha simpatia
Basta que ela exista para que eu tenha razão de ser!"

Fernando Pessoa
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"Matar ou capturar um homem são tarefas relativamente fáceis, se comparadas com a tarefa de mudar sua mentalidade"

R. Cohen
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“O homem não é tão ferido pelo que acontece, e sim por sua opinião sobre o que acontece”

(Montagne)
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“Perturbam os homens não as coisas, mas a opinião que delas se têm” – Epicteto (filósofo grego)

“Não há nada que seja bom ou ruim, mas pensar é que torna as coisas boas ou más” – William Shakespeare

“Quem sabe dominar seus pensamentos sabe governar a sua vida” – R.W. Trine
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“Contra o positivismo, que pára diante das coisas e diz: “Há somente fatos”, eu digo: Ao contrário, fatos é o que não há; há somente interpretações”.(Nietzsche)
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"Quem se senta no fundo do poço para contemplar o céu, há de achá-lo pequeno."
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Sobre a verdade e a ciência

A lógica da descoberta científica (Karl Poper)

Não se iludam. A ciência não está alicerçada na rocha. A vasta estrutura de suas teorias ergue-se sobre um pântano. E como um edifício sustentado por estacas que mergulham num terreno movediço mas não atingem nenhuma base natural. Muitas questões fundamentais para a ciência continuam em aberto. Se não queremos nos ver reduzidos a meras fatias do conhecimento oficial, precisamos manter abertas também as nossas mentes.

Sobre o(a) autor(a): Filósofo austríaco que trabalha com o racionalismo crítico, ocupando-se principalmente com questões da teoria do conhecimento e epistemologia. Para ele todo conhecimento é falível e corrígel, virtualmente provisório.
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“Tudo na ciência começa com a superstição” Skinner
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“A coisa mais bela que o homem pode experimentar é o mistério. É essa emoção fundamental que está na raiz de toda ciência e toda arte” Eintein
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Sobre os paradigmas

Perante a lei (Franz Kafka)

Há uma porta que dá para a lei. Diante dela, um guardião, o guardião da porta da lei. Um homem simples chega e pede para entrar. O guardião responde que, naquele dia, não é permitido entrar. O homem pensa um pouco e pergunta quando poderá entrar. O guardião responde que de repente, mas não agora. Como a porta da lei está aberta, o homem simples se agacha para olhar para dentro por entre as pernas do guardião. O guardião impede o homem de olhar e o adverte que lá dentro há outras portas e outros guardiães, cada um mais forte e feroz que o outro.O homem simples não imaginava encontrar obstáculos, pois sempre pensara que a lei deveria ser acessível a todos os homens.O guardião lhe empresta um banquinho para que possa sentar-se à porta da lei e ficar esperando a hora de entrar. Passam-se os dias e os anos. O homem simples continua perguntando quando poderá entrar. O guardião lhe dá respostas vagas e impessoais, repetindo sempre que a hora de entrar ainda não chegou.O homem simples tira a roupa do corpo e tenta subornar com ela o guardião da porta da lei. O guardião não recusa: “Aceito, para que você não diga que não tentou tudo. Aceito, mas ainda não posso permitir a sua entrada”.Com o passar dos anos, o homem simples maldiz seu destino perverso, de dor, sofrimento e velhice sem poder cruzar a porta da lei, que ali continua, diante dele, emanando uma claridade que ofusca seus olhos cansados. Nada lhe resta senão a morte. Agonizando, ocorre-lhe perguntar ao guardião por que durante todos aqueles anos em que esperou, não apareceu nenhuma outra pessoa pedindo para entrar pela porta da lei. E o guardião responde: “Ninguém quis entrar por esta porta porque ela se destina apenas a você!... Agora, com sua morte, terei de fechá-la”.

Outra Praia (Carlos Heitor Cony)

Oleg Svinorg foi o único náufrago que conseguiu chegar a terra firme. O navio afundara ao largo, todos se afogaram. Somente Oleg, um gigante de 2 metros de altura, teve forças para nadar até a praia. Nem sabia que praia era. Um náufrago se salva em qualquer pedaço de terra. Encontrou desolação à sua volta. Campos cobertos de capim, rios apodrecidos, e em toda parte, miseráveis que nem puderam socorrê-lo, porque estavam mais famintos e desesperados do que Oleg. Perguntou se havia alguma coisa equivalente a um poder naquela ilha, não exatamente um governo, mas uma comissão qualquer que cuidasse de melhorar as condições em que todos viviam. Sim!... Havia uma comissão de notáveis que trabalhavam dia e noite para reformar o que fosse preciso e – aí sim – a ilha conheceria a prosperidade que todos desejavam. Oleg procurou saber onde se reuniam os salvadores da ilha. Foi lá e viu umas 500 pessoas discutindo se, no país em dificuldade, a taxa de câmbio deveria ser superior ou inferior a 6,2%, se os maiores de 60 anos teriam direito ao redutor de 25% acrescido pelo coeficiente do tempo de serviço, embora não houvesse serviço algum naquela ilha.Um pequeno grupo escrevia tudo o que era discutido e comunicava de tempos em tempos a novidade ao resto da ilha. Mas ninguém entendia como iam ficar as coisas e dava tudo na mesma! O mais importante, que inflamava corações e mentes, era a taxa de juros, que estava altíssima. E havia uma turma que achava a inflação pior do que a fome e o desemprego que atingia a todos. Para combatê-la, os juros deveriam ser aumentados, disciplinando o consumo, porque ninguém consumia nada.Oleg ouviu tudo e entendeu pouco, mas o bastante para atirar-se de volta às ondas e nadar em busca de outra praia.

Trecho do texto de Thiago CunhaThiago Cunha


Impressiona-me a forma como perseguimos a notícia. O furo de reportagem nos incentiva a superar os limites da máquina e do homem. Chegamos ao local do crime. Os rostos dos miseráveis parecem felizes com a nossa presença naquele lugar desconhecido. Sonham sair do ostracismo pelo caminho mais trágico: a notícia da morte violenta. Uma cena chocante: as pessoas sorriam enquanto rodeavam o morto. Achavam o máximo a possibilidade de ver alguém daquele fim-de-mundo nas páginas policiais do dia seguinte. Gritos de protesto? Nenhum. Busca por justiça? Inútil. Presente à cena do crime, a polícia cuidava de colher dados sobre o morto: idade, profissão, ligações com entorpecentes. Só. Entraria nas estatísticas. Dos pobres, é claro. Jamais um inquérito bem formulado como possuem as atrocidades cometidas contra pessoas da classe média e da classe alta. No mais, ninguém viu nada. Nem ouviu. Ninguém desconfiava de nada e de ninguém. Não havia motivos para que aquilo tivesse acontecido.E eis que a mãe da vítima, sentada no meio-fio, junto ao corpo do filho, vira-se para o repórter, verdadeiro abutre da tragédia, e oferece-lhe uma foto do filho morto, para que apareça no jornal do dia seguinte, no espaço destinado aos consumidores da barbárie. Quem será pior? Os abutres que perseguem a morte para registrá-la ou os que ratificam a loucura, devorando no jornal cada detalhe de um assassinato? Ou seremos todos, nós e eles, a serpente que devora a própria cauda?


Sobre o(a) autor(a):Estudante de Marketing de apenas 21 anos, Thiago já escreve seus textos com o propósito delançar um livro, futuramente.

Sobre o(a) autor(a):Escritor tcheco de língua alemã (1883-1924). Considerado um dos principais escritores da Literatura moderna. Retrata as ansiedades e a alienação do homem do século XX. Escreve ainda A Metamorfose (1916) e O Castelo (1926)

A verdadeira dívida externa. (Guaicaipuro Cautémoc)

Eu, Guaicaipuro Cautémoc, descendente dos que povoaram a américa há 40 mil anos, vim aqui encontrar os que nos encontraram há apenas 500 anos. O irmão advogado europeu me explica que aqui toda dívida deve ser paga, ainda que para isso se tenha que vender seres humanos ou países inteiros. Pois bem! Eu também tenho dívidas a cobrar. Consta no arquivo das Índias Ocidentais que entre os anos de 1503 e 1660, chegaram à Europa 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata vindos da minha terra!... Teria sido um saque? Não acredito. Seria pensar que os irmãos cristãos faltaram a seu sétimo mandamento.Genocídio?... Não. Eu jamais pensaria que os europeus, como caim, matam e negam o sangue de seu irmão.Espoliação?... Seria o mesmo que dizer que o capitalismo deslanchou graças à inundação da Europa pelos metais preciosos arrancados de minha terra! Vamos considerar que esse ouro e essa prata foram o primeiro de muitos empréstimos amigáveis que fizemos à Europa. Achar que não foi isso seria presumir a existência de crimes de guerra, o que me daria o direito de exigir a devolução dos metais e a cobrar indenização por danos e perdas. Prefiro crer que nós, índios, fizemos um empréstimo a vocês, europeus. Ao comemorar o quinto centenário desse empréstimo, nos perguntamos se vocês usaram racional e responsavelmente os fundos que lhes adiantamos.Lamentamos dizer que não. Vocês dilapidaram esse dinheiro em armadas invencíveis, terceiros reichs e outras formas de extermínio mútuo. E acabaram ocupados pelas tropas da OTAN. Vocês foram incapazes de acabar com o capital e deixar de depender das matérias primas e da energia barata que arrancam do terceiro mundo. Esse quadro deplorável corrobora a afirmação de Milton Friedmann, segundo o qual uma economia não pode depender de subsídios. Por isso, meus senhores da Europa, eu, Guaicaipuro Cautémoc, me sinto obrigado a cobrar o empréstimo que tão generosamente lhes concedemos há 500 anos. E os juros.É para seu próprio bem. Não, não vamos cobrar de vocês as taxas de 20 a 30 por cento de juros que vocês impõem ao terceiro mundo. Queremos apenas a devolução dos metais preciosos, mais 10 por cento sobre 500 anos.Lamento dizer, mas a dívida européia para conosco, índios, pesa mais que o planeta terra!... E vejam que calculamos isso em ouro e prata. Não consideramos o sangue derramado de nossos ancestrais!Sei que vocês não têm esse dinheiro, porque não souberam gerar riquezas com nosso generoso empréstimo. Nas há sempre uma saída: entreguem-nos a Europa inteira, como primeira prestação de sua dívida histórica.

Sobre o(a) autor(a):Fala do cacique Guaicaipuro Cautémoc numa reunião com chefes de estado da Comunidade Européia.

Sobre o sonhador

O homem e sua sombra (Affonso Romano de Sant´Anna)

O homem e sua sombra. Era um homem com sombra de cachorro, que sonhava ter sombra de cavalo, mas era um homem com sombra de cachorro. E isto, de algum modo me incomodava. Por isto, aprisionou-se num canil. E altas horas da noite, enquanto a sombra lhe agrava, sua alma em pêlo galopava.

Sobre o(a) autor(a):Criado em Juiz de Fora, tem uma infância de menino pobre. Custeia seus estudos na Faculdade de Letras de Belo Horizonte, tornando-se bacharel. Fez parte dos movimentos que transformaram a poesia brasileira, construindo sua própria linguagem e trajetória.
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Sonho (Alex Polari)

Acreditávamos que mudaríamos o mundo:à noite, sonhávamos e, durante o dia, comíamos os sonhos da padaria em frente.

Sobre o(a) autor(a):Alex Polari, paraibano, 1951. Teve seu 1º livro publicado em 78, época em estava preso por sua militância política. Ficou preso entre 71 e 80. Em 80 passou a fazer parte da comunidade esotérica Santo Daime. Sua poesia tem forte sabor de cárcere e tortura.


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Poema Transitório

(...) é preciso partir
É preciso chegar
É preciso partir é preciso chegar...
Ah, como esta vida é urgente!...
No entanto eu gostava mesmo era de partir...
E - até hoje - quando acaso embarco para alguma parte
Acomodo-me no meu lugar
Fecho os olhos e sonho:viajar, viajar
Mas para parte nenhuma...
Viajar indefinidamente...
Como uma nave espacial perdida entre as estrelas.

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DO SONHO (Quintana)

"Sonhar é acordar-se para dentro."


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"Uma vida não basta ser vivida.
Ela também precisa ser sonhada" Quintana
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"O futuro pertence aqueles que acreditam na beleza dos seus sonhos."

Eleanor Roosevelt

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Sobre a humildade

Não tenha nada nas mãos (Fernando Pessoa)

Não tenhas nada nas mãos nem uma memória na alma,
Que quando te puserem nas mãos o óbolo último,
Ao abrirem-te as mãos nada te cairá.
Que trono te querem darque átropos to não tire?
Que louros que não fanemnos arbítrios de minos?
Que horas que te não tornemda estatura da sombra.
Que serás quando foresna noite e ao fim da estrada.
Colhe as flores mas larga-as, das mãos mal as olhaste.
Senta-te ao sol.
Abdica a ser rei de ti próprio.

Sobre o(a) autor(a): Fernando Pessoa (1888 - 1935) nasceu em Lisboa. Considerado um dos mais importantes poetas modernistas. Criou heterônimos famosos como Alberto Caieiro, Ricardo Reis e Álvaro Campos.
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“O grande rei é aquele que desisti sempre da própria coroa. O grande vencedor é aquele que nunca vence. Que vive dos meios e não dos fins” – Reginaldo
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Sobre o existencialismo

Meus Amigos (Jorge Luis Borges)

Meus amigos, por aqui também passou a guerra. Digo “também” porque a sentença pode ser aplicada a quase todos os lugares do planeta. Ao lado do sexo e dos sonhos, o homem matar o homem é um dos hábitos mais antigos de nossa singular espécie. Aqui, na américa do sul, sentimos nas muralhas e nas casas, de maneira inequívoca, a presença desse passado. Não importam, como continuarão a não importar, as datas e os nomes próprios. Todos seremos parte do esquecimento, a tênue substância de que é feito o universo.

Sobre o(a) autor(a):Jorge Luis Borges é argentino, mas sua literatura teve forte influência dos autores ingleses. Nas poesias e ensaios, a biblioteca de seu pai é uma referência constante.

Sobre a guerra

Exércitos Ocidentais na Rússia (León Tolstói)

Em junho de 1812, os exércitos ocidentais transpuseram as fronteiras da Rússia e começou a guerra. Quer dizer, um acontecimento contrário à razão e à natureza. Milhões de homens foram cometer crimes – pilhagens, incêndios e assassínios – mais crimes do que contêm todos os tribunais do mundo. Durante esse período, os poderosos, verdadeiros responsáveis por esses crimes, não viram crime algum. Sua experiência já lhes ensinara que a guerra é o que vale. O que acontece na guerra não lhes tem a menor importância.

Sobre o(a) autor(a): 1828-1910. Escritor russo de grande influência na literatura política de seu país.Grandes obras: Guerra e Paz / Anna Karenina.

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Xadrez (Rosario Castelanos)

Porque éramos amigos e, talvez, para juntar outros interesses aos muitos que nos obrigávamos, decidimos jogar jogos de inteligência. Pusemos um tabuleiro frente a nós, equitativo em peças, em valores e em possibilidades de movimentos. Aprendemos as regras, juramos respeitá-las, e a partida teve início. Eis-nos aqui, há um século sentados, meditando encarniçadamente em como dar a estocada última que aniquile inapelavelmente e para sempre... o outro!

Sobre o(a) autor(a): Nasceu em 1925 na Cidade do México. Estudou Filosofia e Letras. Professora, diretora de teatros e embaixadora do México em Israel entre 1971 - 74.

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EVOLUÇÃO

"O que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro".

Mario Quintana - Caderno H

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"As ciências físicas atingiram um tal estado de desenvolvimento que agora todos os homens podem morrer juntos. Cabe agora às ciências sociais atingirem um tal estado de desenvolvimento de forma que todos os homens possam viver juntos".

R. Stagner

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"O assassinato dentro da própria espécie, seja em escala individual ou coletiva, é um fenômeno desconhecido no reino animal, exceto pelo homem e por algumas variedades de ratos e formigas"

Arthur Koestler

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" Apenas uma guerra é permitida à espécie humana: a guerra contra a extinção."

Isaac Asimov
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Sobre a desigualdade social e a conivência

Balanço 2 (Darcy Ribeiro)

O Brasil cresceu visivelmente nos últimos 80 anos. Cresceu mal, porém. Cresceu como um boi mantido, desde bezerro, dentro de uma jaula de ferro. Nossa jaula são as estruturas sociais medíocres, inscritas nas leis, para compor um país da pobreza na província mais bela da terra. Sendo assim, no Brasil do futuro, a maioria da gente nascerá e viverá nas ruas, em fome canina e ignorância figadal, enquanto a minoria rica, com medo dos pobres, se recolherá em confortáveis campos de concentração, cercados de arame farpado e eletrificado. Entretanto, é tão fácil nos livrarmos dessas teias, e tão necessário, que dói em nós... a nossa conivência culposa

Sobre o(a) autor(a):Grande educador e antropólogo de impacto mundial. Foi Ministro da Educação com pouco mais de 30 anos, Ministro Chefe da Casa Civil, vice-governador do Rio e senador. Foi imortalizado pela Academia Brasileira de Letras.


Provocações (Luís Fernando Veríssimo)

A primeira provocação ele agüentou calado. Na verdade, gritou e esperneou. Mas todos os bebês fazem assim, mesmo os que nascem em maternidade, ajudados por especialistas. E não como ele, numa toca, aparado só pelo chão. A segunda provocação foi a alimentação que lhe deram, depois do leite da mãe. Uma porcaria. Não reclamou porque não era disso. Outra provocação foi perder a metade dos seus dez irmãos, por doença e falta de atendimento. Não gostou nada daquilo. Mas ficou firme. Era de boa paz. Foram lhe provocando por toda a vida. Não pode ir a escola porque tinha que ajudar na roça. Tudo bem, gostava da roça. Mas aí lhe tiraram a roça. Na cidade, para aonde teve que ir com a família, era provocação de tudo que era lado. Resistiu a todas. Morar em barraco. Depois perder o barraco, que estava onde não podia estar. Ir para um barraco pior. Ficou firme. Queria um emprego, só conseguiu um subemprego. Queria casar, conseguiu uma submulher. Tiveram subfilhos. Subnutridos. Para conseguir ajuda, só entrando em fila. E a ajuda não ajudava. Estavam lhe provocando. Gostava da roça. O negócio dele era a roça. Queria voltar pra roça. Ouvira falar de uma tal reforma agrária. Não sabia bem o que era. Parece que a idéia era lhe dar uma terrinha. Se não era outra provocação, era uma boa. Terra era o que não faltava. Passou anos ouvindo falar em reforma agrária. Em voltar à terra. Em ter a terra que nunca tivera. Amanhã. No próximo ano. No próximo governo. Concluiu que era provocação. Mais uma. Finalmente ouviu dizer que desta vez a reforma agrária vinha mesmo. Para valer. Garantida. Se animou. Se mobilizou. Pegou a enxada e foi brigar pelo que pudesse conseguir. Estava disposto a aceitar qualquer coisa. Só não estava mais disposto a aceitar provocação. Aí ouviu que a reforma agrária não era bem assim. Talvez amanhã. Talvez no próximo ano... Então protestou. Na décima milésima provocação, reagiu. E ouviu espantado, as pessoas dizerem, horrorizadas com ele: - Violência, não!

Sobre o(a) autor(a):Nasceu em 26 de setembro 1936, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Filho do grande escritor Érico Veríssimo, iniciou seus estudos no Instituto Porto Alegre, tendo passado por escolas nos Estados Unidos quando morou lá.

A Vida de Galileu (Bertolt Brecht)

Não há sentido na nossa miséria; fome não é prova de fortaleza, é apenas não ter comido!... Esforço não é vergar as costas e arrastar, não é mérito!... A miséria não é condição das virtudes, meus amigos!... E não me venham com a beleza das riquezas que fomos capazes de produzir!...Se a nossa gente fosse abastada e feliz, aprenderia as virtudes da abastança e da felicidade. Mas hoje, as virtudes dos pobres nascem... da pobreza!Eu abomino isso! Sim, abomino! Ou vocês querem que eu minta a nossa gente?

Sobre o(a) autor(a):Bertold Brecht (1898-1956), nascido em Augsburgo. Escritor e dramaturgo alemão, além de grande teórico teatral. Desde menino escrevia poesias de forte conteúdo social. Foi perseguido pelos nazistas pelo seu comunismo militante.

Desbarato (José Saramago)

O desbarato mais absurdo não é o dos bens de consumo, mas o da humanidade: milhões e milhões de seres humanos nasceram para ser trucidados pela História, milhões e milhões de pessoas que não possuíam mais do que as suas simples vidas. De pouco ela lhes iria servir, mas nunca faltou quem de tais miudezas se tivesse sabido aproveitar. A fraqueza alimenta a força, para que a força esmague a fraqueza.

Sobre o(a) autor(a):Um dos mais conhecidos autores portugueses contemporâneos, nasceu em 1922 - Portugal. Concluiu apenas os estudos secundários. Poeta, romancista, dramaturgo e tradutor. Foi o desemprego que o levou à literatura. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1998.

Sobre a vida

" A Vida" (Raquel Naveira)

A vida bate como um relógio.
Um arfar de vento no capim.
É fome que rói as entranhas, facho que ilumina os olhos, percorre o corpo em incêndio e queima os lábios de paixão.
Um cheiro de carne, de vinho, de fruta recém-tirada do pé.
A vida recende violenta.
Por que não abocanhá-la inteira, cruel, vermelha, suculenta, escorrendo sangue pelos dentes?




"Ser criado, gerar-se, transformar-se
O amor em carne e a carne em amor
Nascer respirar, e chorar, e adormecer
E se nutrir para poder chorar
Para poder nutrir-se
E despertar
Um dia à luz e ver, ao mundo e ouvir
E começar a amar e então sorrir
E então sorrir para poder chorar
E crescer, e saber, e ser, e haver
E perder, e sofrer, e ter horror
De ser e amar, e se sentir maldito
E esquecer de tudo ao vir um novo amor
E viver esse amor até morrer
E ir conjugar o verbo no infinito..."

(Vinícius de Moraes)

Sobre a infância

Vontade de voltar (Affonso Romano Sant´Anna)

Vontade de voltar,vontade de voltar e guiar aquele menino desamparado.Desamparado, não dos pais e nem da grande parentela. Desamparado no que temos de mais infantilmente desamparado. Desamparado diante das sevícias do dia. Isto de cortasse nas cercas, rolava escada abaixo. Despencar dos galhos, assustar-se com os sacis. O culto atrás da porta. Entregar-se ao sono, enquanto os escorpiões passeiam sobre a fronha e lhe ameaçam os sonhos. Vontade de voltar e proteger aquele menino. Encalto menino. Dando afetos a insetos e felinos. Caminhando desatento ao vento. Seguindo a sua trilha na neblina.

Sobre o(a) autor(a):Criado em Juiz de Fora, tem uma infância de menino pobre. Custeia seus estudos na Faculdade de Letras de Belo Horizonte, tornando-se bacharel. Fez parte dos movimentos que transformaram a poesia brasileira, construindo sua própria linguagem e trajetóriaia.

Sobre a paciência, tolerância a frustração, adiamento de reforço

Seja Paciente (Rainer Maria Rilke)

Quero lhe implorar Para que seja paciente
Com tudo o que não está resolvido em seu coração e tente amar.
As perguntas como quartos trancados e como livros escritos em língua estrangeira.
Não procure respostas que não podem ser dadas porque não seria capaz de vivê-las.
E a questão é viver tudo. Viva as perguntas agora.
Talvez assim, gradualmente, você sem perceber, viverá a resposta num dia distante.

Sobre o(a) autor(a):Escritor e poeta, nascido em Praga, teve uma infância difícil, estudou nas Universidades de Praga, Munique e Berlim. Sua obra, com seu hermetismo, solidão e ociosidade, chegou a um profundo existencialismo e influenciou os escritores dos anos cinqüenta

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"Transporte um punhado de terra todos os dias, e você fará uma montanha."

Desconhecido
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" Paciência e perseverança têm o efeito mágico de fazer desaparecer as dificuldades e sumir os obstáculos."

John Quincy Adams
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"Não perca a tolerância. É muita gente para tolerar você naquilo que você ainda tem de indesejável."

André Luiz
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Sobre educação

O estudante (Emmanuel Kant)

"O estudante não deve aprender pensamentos, ele deve aprender a pensar. Nós não devemos transportá-lo, mas ajudá-lo, se quisermos que seja capaz de encontrar seu próprio caminho."

Sobre o(a) autor(a): Kant nasceu e viveu em Koenigsberg, Prússia Oriental.Seu método é a "crítica", isto é, a análise reflexiva. "Só conhecemos o mundo através de quadros subjetivos do espaço e tempo", diz Kant. Guilherme II o obrigou a não mais escrever sobre religião.
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Sobreviventes (Anônimo)

Esse texto, anônimo, foi encontrado ao fim da segunda Guerra Mundial num campo de concentração nazista:"Sou sobrevivente de um campo de concentração. Meus olhos viram o que ninguém deveria ter visto.Câmaras de gás construídas por engenheiros formados. Crianças envenenadas por médicos diplomados. Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês fuzilados e queimados por graduados de colégios e universidades.Assim... são muitas as minhas suspeitas sobre a educação!"

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Educação

"O mais difícil, mesmo, é a arte de desler."

Mário Quintana
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"Longo é o caminho ensinado pela teoria, curto e eficaz o do exemplo."

Seneca
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"Só os instruídos são livres"
Epicteto, século I a.C
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“O que eu sei foi a vida que me ensinou, e como eu não prestava muita atenção e falava muito, aprendi pouco.”

( O flagelo do vestibular, 1977) – Luis Fernando Veríssimo
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“Sempre que ensinares, ensina a duvidarem do que estiver ensinando”

José Ortega Y Gasset – Filósofo Espanhol – 1883-1955
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Sobre a mudança

Não me envergonho de mudar de idéia, porque não me envergonho de pensar." (Pascal)


Mude (Edson Marques)

Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade.
Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.Tome outros ônibus. Mude por uns tempos o estilo das roupas. Dê os seus sapatos velhos. Procure andar descalço alguns dias.Tire uma tarde inteira para passear livrementena praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos.Veja o mundo de outras perspectivas. Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama...Depois, procure dormir em outras camas. Assista a outros programas de tv, compre outros jornais...Leia outros livros, viva outros romances. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo. Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua. Corrija a postura. Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias. Tente o novo todo dia. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor, a nova vida. Tente. Busque novos amigos tente novos amores. Faça novas relações. Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, tome outro tipo de bebida compre pão em outra padaria. Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa. Escolha outro mercado...Outra marca de sabonete, outro creme dental...Tome banho em novos horários. Use canetas de outras cores. Vá passear em outros lugares. Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes. Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias. Jogue os velhos relógios, despertadores. Abra conta em outro banco. Vá a outros cinemas, outros cabelereiros, outros teatros, visite novos museus. Mude. Lembre-se de que a vida é uma só. E pense seriamente em arrumar um outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso, mais digno, mais humano. Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo. E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino. Experimente coisas novas.Troque novamente. Mude, de novo. Experimente outra vez. Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa. O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda! Repito por pura alegria de viver: A salvação é pelo risco, sem o qual a vida não vale a pena!!!

Sobre o(a) autor(a): Edson Marques, poeta, formado em Filosofia pela USP. Vencedor do Prêmio Cervantes/Ibéria em 1993. Sócio-fundador da Ordem Nacional dos Escritores. Se diz "um socialista romântico". Lançou o livro: "Manual da Separação".




Não seja o mesmo (Julian Green)

Você sabe tão bem quanto eu, que uma das principais causas do tédio é a estreiteza do nosso destino.Todas as manhãs, despertamos iguais ao que éramos na véspera. Ser eternamente o mesmo é insuportável para os espíritos refinados pela reflexão. Sair do próprio eu é um dos sonhos mais inteligentes que um homem pode ter.

Sobre o(a) autor(a):Grande romancista norte-americano. Um dos escritores católicos mais conhecidos deste último século.

A Morte Devagar (Martha Medeiros)

Morre lentamente quem não troca de idéias, não troca de discurso, evita as próprias contradições. Morre lentamente quem vira escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajeto e as mesmas compras no supermercado. Quem não troca de marca, não arrisca vestir uma cor nova, não dá papo para quem não conhece. Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru e seu parceiro diário. Muitos não podem comprar um livro ou uma entrada de cinema, mas muitos podem, e ainda assim alienam-se diante de um tubo de imagens que traz informação e entretenimento, mas que não deveria, mesmo com apenas 14 polegadas, ocupar tanto espaço em uma vida. Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o preto no branco e os pingos nos is a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam brilho nos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos. Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos. Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não acha graça de si mesmo. Morre lentamente quem destrói seu amor-próprio. Pode ser depressão, que é doença séria e requer ajuda profissional. Então fenece a cada dia quem não se deixa ajudar. Morre lentamente quem não trabalha e quem não estuda, e na maioria das vezes isso não é opção e, sim, destino: então um governo omisso pode matar lentamente uma boa parcela da população. Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projeto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe. Morre muita gente lentamente, e esta é a morte mais ingrata e traiçoeira, pois quando ela se aproxima de verdade, aí já estamos muito destreinados para percorrer o pouco tempo restante. Que amanhã, portanto, demore muito para ser o nosso dia. Já que não podemos evitar um final repentino, que ao menos evitemos a morte em suaves prestações, lembrando sempre que estar vivo exige um esforço bem maior do que simplesmente respirar.

Sobre o(a) autor(a): Martha Medeiros nasceu em Porto Alegre em 1961. Formada em Publicidade. Escreveu livros de poesias e de crônicas, seu mais recente lançamento é o livro de ficção: Divã. Martha é cronista do jornal Zero Hora.

Sobre a utopia

Eduardo Galeano

Eu dou um passo, ela dá dois passos.
Eu dou dois passos, ela dá quatro passos.
Eu dou quatro passos, ela dá oito passos.
Para isso serve a utopia, para eu seguir caminhando.

Sobre o(a) autor(a):Jornalista e escritor nascido no Uruguai



Utopia

Se as coisas são inatingíveis...ora!
Não é motivo para não quere-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A mágica presença das estrelas!

Sobre a verdade

A Verdade (Cruzeiro Seixas)

Como posso saber se o que vejo desta janela é de fato a paisagem que vejo?...
Há muito, finjo acreditar em coisas que o homem teima em trocar pela fragilidade do vidro.
Deus existe?...Deus não existe?...Ambas as coisas são verdade ao mesmo tempo.
Pergunto-me e pergunto-lhe se a verdade existe mais que um milésimo de segundo.
Nada é eterno. A eternidade passa depressa como a ciência.

Sobre o(a) autor(a): Cruzeiro Seixas, pintor e poeta, nome essencial vinculado ao Surrealismo em Portugal. Em parte por ligação direta com as artes plásticas tem sido um poeta, infelizmente, pouco percebido.

T. Todorov

Nada é mais perigoso que a certeza de ter razão.
É preciso idolatrar a dúvida.

Sobre o(a) autor(a):Crítico francês de origem búlgara. Estudou na Universidade de Sofía. Desde 1982 se consagrou em estudos de fenômenos históricos e aspectos da filosofia moral.


Esperança (Cruzeiro Seixas)

Todo o meu esforço canalizo para a vida. Não para o equilíbrio, não para as certezas. Caminho suportando nas costas todo o peso da desesperança, pois que a esperança, é ridículo, dramático, que a humanidade ainda precise de tê-la. Esperança em quê? Em remédios que curem?... Em poemas que se dão de mão em mão?E as cartas sem resposta?E os becos sem saída?E a nova hipocrisia?E o deus-dinheiro que nos espreita a cada esquina?... e a África? E a América Latina?...E todas essas universidades e tantos analfabetos?...Toda gente sabe a extensão da verdade: surpreendendo a paisagem esfomeada, o gatilho já não precisa do dedo de ninguém.

Sobre o(a) autor(a): Cruzeiro Seixas, pintor e poeta, nome essencial vinculado ao Surrealismo em Portugal. Em parte por ligação direta com as artes plásticas tem sido um poeta, infelizmente, pouco percebido.

Não entendo (Clarice Lispector)

Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.

Sobre o(a) autor(a): A escritora nasceu na Ucrânia, mas viveu no Brasil desde os dois meses de idade. Suas obras mais famosas incluem Laços de Família, A Paixão Segundo G.H. e A Hora da Estrela. Nos textos, Clarice explora a solidão e a incomunicabilidade humana.




Eterno (Carlos Drummond de Andrade)


Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo,
Mas com tamanha intensidade, que se petrifica,
E nenhuma força jamais o resgata!

Fácil é ouvir a música que toca.
Difícil é ouvir a sua consciência.
Acenando o tempo todo, mostrando nossas escolhas erradas.

Fácil é ditar regras.
Difícil é segui-las.
Ter a noção exata de nossas próprias vidas,
Ao invés de ter noção das vidas dos outros.

Fácil é perguntar o que deseja saber..
Difícil é estar preparado para escutar esta resposta.
Ou querer entender a resposta.

Fácil é chorar ou sorrir quando der vontade.
Difícil é sorrir com vontade de chorar ou chorar de rir, de alegria.

Fácil é dar um beijo.
Difícil é entregar a alma.
Sinceramente, por inteiro.

Fácil é sair com várias pessoas ao longo da vida.
Difícil é entender que pouquíssimas delas vão te aceitar
Como você é e te fazer feliz por inteiro.

Fácil é ocupar um lugar na caderneta telefônica.
Difícil é ocupar o coração de alguém